O Ayurveda é um sistema de medicina ancestral que considera o ser humano de forma integral. Nesse sentido, ele não segmenta e isola funções do organismo. Pelo contrário, ele busca compreender o funcionamento do corpo humano como o sistema complexo que ele é.
E a forma que os sábios da antiguidade encontraram para explicar todas as funções realizadas pelo nosso organismo foi através dos doshas.
Também conhecidos como humores ou biotipos, os doshas são os responsáveis pela nossa fisiologia, ou seja, todos os processos físico-químicos que o nosso organismo realiza diariamente.
Sendo assim, abrir e fechar os olhos, crescer, digerir, caminhar, bocejar, respirar, absolutamente tudo o que fazemos é devido aos doshas.
Mas o que são os doshas afinal? E qual a importância deles no Ayurveda?
O que é dosha, afinal?
No Ayurveda, doshas são as unidades funcionais do nosso organismo, ou seja, os responsáveis por manter o nosso corpo em funcionamento. Eles são considerados componentes da vida, portanto, estão presentes em qualquer ser vivo.
Quando estão em equilíbrio, eles dão suporte ao nosso corpo, auxiliando-o a executar suas funções com qualidade. No entanto, quando não estão equilibrados, podem prejudicar a nossa saúde.
Imagine que os doshas são como as engrenagens de um relógio. Quando as engrenagens funcionam em perfeita harmonia, o relógio se mantém em perfeito funcionamento.
Mas, caso uma das engrenagens apresente defeito, o relógio pode começar a atrasar, um dos ponteiros pode ficar preso e todo o maquinário pode simplesmente pifar.
Com os doshas acontece algo bem parecido. Por isso, na Medicina Ayurveda, sempre começamos qualquer diagnóstico buscando entender os sintomas da paciente e como eles estão relacionados aos desequilíbrios dos doshas.
Os 5 doshas no Ayurveda
Segundo o Ayurveda, existem dois tipos de doshas: os doshas do corpo (sharirika doshas) e os doshas da mente (manasika doshas).
Os três doshas do corpo são vata, pitta e kapha. Já os doshas da mente são rajas e tamas.
Embora façamos essa divisão para compreendermos melhor como eles funcionam, a verdade que é que quando um deles entra em desequilíbrio, pode afetar os demais e desencadear problemas sistêmicos, ou seja, doenças.
E já que falamos neles, que tal conhecer melhor as características dos doshas?
Vata dosha: características
Vata dosha é responsável pelo movimento em nosso corpo e é formado predominantemente por akasha e vayu mahabhuta, ou seja, espaço e ar.
Quando pensamos em espaço e ar, o que vem à nossa mente? Frieza e secura. E essas são as qualidades principais de vata dosha. Mas não são as únicas. Ele também é leve, áspero, sutil e móvel. Em sânscrito, as características do dosha vata são: ruksha, laghu, shita, khara, sukshma e chala.
Também conhecido como maruta ou vayu, vata dosha pode ser subvidivido em cinco tipos de manifestação em nosso corpo:
- prana vayu
- udana vayu
- vyana vayu
- samana vayu
- apana vayu
Cada uma dessas subdivisões é responsável por funções específicas no organismo e pode ocasionar desequilíbrios próprios. Dessa forma, além de analisar os gunas ou qualidades de vata que estão desequilibradas, também precisamos nos atentar para as interações entre esses “subdoshas”.
Somente desta maneira poderemos restabelecer o equilíbrio do organismo.
Pitta dosha: características
Pitta dosha é o responsável por todas as transformações que ocorrem em nosso organismo, sendo que a digestão é a mais simbólica delas dentro do Ayurveda.
Contudo, não podemos nos esquecer do metabolismo como um todo, bem como da apreensão de conhecimento, que também são processos de transformação.
Com relação aos panchamahabhutas, pitta dosha é formado por agni (fogo) e jala (água).
E quais são os gunas de pitta dosha?
- sasneha: levemente oleoso
- tikshna: penetrante
- ushna: quente
- laghu: leve
- visra: viscoso
- sara: fluido
- drava: líquido
Assim como em vata dosha, precisamos olhar essas características do dosha pitta para compreender o que exatamente está em desequilíbrio no organismo da pessoa, para só então entrarmos com o tratamento adequado.
Kapha dosha: características
Kapha dosha, por sua vez, é o responsável por dar estabilidade ao nosso organismo. Ele é formado por jala e prthvi mahabhuta, ou seja, água e terra.
Se você já brincou com lama, talvez já consiga antecipar algumas das características do dosha kapha:
- snigdha: oleoso
- shita: frio
- guru: pesado
- manda: lendo
- slakshana: suave
- mrtsna: viscoso
- sthira: estável
Trazendo para a física e química modernas, kapha dosha é a força de coesão que mantém todas as células do nosso corpo unidas.
Agora que você já sabe um pouco mais sobre o que são os doshas e quais são seus tipos, talvez esteja se perguntando de onde eles surgem. Acertei? Então continue para o próximo tópico.
Qual a origem dos doshas?
Como tudo no Ayurveda, os doshas do corpo têm sua origem nos panchamahabhutas, ou seja, nos cinco grandes elementos constituintes da matéria. São eles: akasha (espaço), vayu (ar), agni (fogo), jala (água) e prthvi (terra).
Ao se combinarem de determinada forma, os panchamahabhutas dão origem aos doshas, da seguinte maneira:
- vata = akasha + vayu
- pitta = agni + jala
- kapha = jala + prthvi
Quando memorizamos isso, fica muito mais fácil identificar quais panchamahabhutas estão presentes nos alimentos e como cada alimento vai afetar os doshas em nosso corpo.
Por exemplo, se pitta dosha é composto dos elementos fogo e água e você come um alimento apimentado, que gera calor no seu corpo, automaticamente haverá um aumento do elemento fogo no seu organismo. Logo, haverá um aumento de pitta dosha.
Se esse aumento é momentâneo, tudo bem. Logo em seguida, pitta dosha voltará ao seu equilíbrio normal. Mas, se esse aumento acontecer todos os dias, pode levar a uma gastrite, por exemplo.
Pegou a ideia? Mais do que entender qual dos doshas está desequilibrado, precisamos identificar quais características dos doshas estão desequilibradas.
É por isso que o Ayurveda é considerado um sistema de medicina de precisão. Afinal, podemos ter dez pessoas com gastrite, cada uma com uma origem diferente para o problema.
Mas não para por aí. Vale lembrar também que os panchamahabhutas são formados pelos mahagunas — Sattva, Rajas e Tamas.
Ou seja, no final das contas, todos eles são manifestações de uma única energia primordial, que conhecemos como Prakrti. Sendo assim, qualquer desequilíbrio no corpo afeta a mente e vice-versa.
Desequilíbrios entendidos? Então vamos ao próximo passo.
Como equilibrar cada dosha?
De acordo com o Ashtanga Hrdayam, quando os doshas estão perfeitamente equilibrados, eles não são considerados mais doshas, e sim dhatus, ou seja, tecidos.
Isso porque dosha significa “aquilo que gera desequilíbrio”. Logo, se não há desequilíbrio, aquilo que gera desequilíbrio deixa de existir.
No entanto, os doshas são entidades em movimento contínuo nosso organismo. Em outras palavras, eles oscilam o tempo todo, seja quando comemos, caminhamos ou dormimos. Por isso, dizemos que eles estão em equilíbrio dinâmico.
Quando esse equilíbrio dinâmico é quebrado e um ou mais doshas começa a prejudicar os dhatus, nós temos algumas formas de devolver o organismo ao seu equilíbrio normal.
Mexer na alimentação é a forma mais simples e natural de recuperar o equilíbrio dos doshas. A partir do conhecimento dos sabores no Ayurveda, podemos usar o alimento como remédio e reestabelecer a nossa saúde.
Outra forma é buscar substâncias que ajudem a pacificar os doshas. Nesse sentido, existem três substâncias por excelência que ajudam a pacificar vata, pitta e kapha, respectivamente: óleo de gergelim, ghee e mel.
Também podemos fazer uso das ervas medicinais para apaziguar os doshas. Nesse caso, precisamos nos atentar para as propriedades de cada planta, como virya (potência), vipaka (sabor pós-digestivo) e prabhava (ação específica), além dos gunas (qualidades) e karma (ação).
Finalmente, podemos lançar mão do panchakarma na pacificação dos doshas. Esse conjunto de terapias visa expulsar os doshas agravados do corpo, devolvendo-o ao seu estado natural.
Como descobrir o seu dosha?
Vamos retomar um pouco do que vimos neste artigo. Doshas são unidades funcionais do nosso organismo, responsáveis por executar todas as atividades inerentes ao nosso corpo.
De modo simples, vata é responsável pelo movimento, pitta pelas transformações e kapha pela estabilidade. Agora para e pensa comigo: dá para viver sem um deles? Ou só com um deles?
Não, né? Por isso, a resposta sobre qual é o seu dosha é bastante simples: todos. Inclusive rajas e tamas, que são os doshas da mente.
Todo e qualquer ser vivo precisa dos cinco doshas para viver. O que você quer saber, verdadeiramente, é qual é a sua prakrti ou constituição corporal.
Mas isso é assunto para o próximo artigo. Se você não quiser perdê-lo, aproveita para assinar a minha newsletter para recebê-lo em primeira mão.
Um abraço e até lá!
Eve.